quinta-feira, 10 de dezembro de 2009
Goticismo-Darkness.
Alguém não é dito gótico por estar de preto da cabeça aos pés, ter infindável amor pela literatura gótica, spleen, regar suas noites em cemitérios ao vinho, ou por ser fanático pelo obnóxio Marilyn Manson; este alguém é gótico porque em seu âmago arde uma fria chama gótica. O goticismo está profundamente ligado à psique humana, às reações, ao modo de filtrar os fatos ao seu redor. Toda produção artística tenebrosa e qualquer outro aspecto ligado ao goticismo é apenas a expressão da visão e do pensamento, manifestação da essência, e não o oposto.
O goticismo não é um estado de "depressão", síndrome do pânico ou qualquer outra doença; alguém que acha que é gótico porque ouve Manson, ou porque é depressivo, ou porque gosta de coisas obscuras, ou suas roupas preferidas são pretas, ou Lorde Byron é seu ídolo ou qualquer fator análogo a esses é um poser. Não devemos, nem podemos, julgar alguém por isso ou por aquilo, mas, sim, acabei de fazê-lo e não há retorno.
O gótico é uma alma corroída, um ser recluso, uma mente brilhante e tenebrosa, não alguém com um rosto amargo que incessantemente atira no esgoto de pobres mentes palavras sobre a morte, lascivas, ou clichês e outras meras "reflexões" superficiais que leu em algum lugar; goticismo é um modo de ver a vida, uma linha de pensamento, é refletir e apurar toda dor e todo riso, é olhar para si mesmo e perguntar-se o porque de cada coisa, é extrair sabedoria de onde as pessoas só extraem lágrimas, extrair das lágrimas força e consciência para não dobrar os joelhos perante toda agonia que a existência os traz e ainda assim resistir diante da consciência da sina universal. Todo pensamento extrato da essência gótica reflete a experiência pessoal de cada indivíduo e não uma generalização, de uma linha em um ponto quanto aos pensamentos extratos, isso varia de pessoa a pessoa, por isso cada um tem sua própria visão do que é goticismo; porque ele é algo essencial e não imposto.
O gótico, em relação à sociedade, é mais dissimulado do que expressivo, principalmente quando tratamos do sofrimento consciente; o gótico é retraído e isso não quer dizer que ele não fala com ninguém, nunca ri ou sofre de algum tipo de timidez excessiva. O gótico é retraído porque ele esconde sua real natureza, ele é retraído e é tímido, porque não quer que ninguém o conheça, ele é retraído porque ele sabe que as outras pessoas não suportariam seu fardo: o sofrimento consciente, a agonia existencial, o angst - isto é - o conhecimento adquirido nas longas e frias noites regadas às lágrimas, em que todos estavam acamados em aconchegantes leitos e somente ele estava no escuro, calado e sentado na dura e fria pedra, pensando sobre a vida, o amor, a injustiça, o ódio e a morte [pode ser que um dia aquele serelepe ser que você sempre viu acompanhado de raios de sol se revele uma mente extremamente reflexiva, forte, consciente e mórbida]. Não estou falando de ser falso ou mentir, mas existem certas coisas que não devem ser mencionadas, principalmente quando não se está em meio a amigos e iguais.
Se o gótico acredita em Deus, ou Satã, ou Wicca ou Set, Lóki, Zeus? Ou se ele deve ser ateu e adverso a qualquer crença ou religião? Tudo é uma mera questão de consciência. Muitos "góticos" dizem que o gótico deve ser ateu, "se não é ateu não é gótico", mas eles mesmos se contradizem ao dizer que o gótico é um pensador livre. Que tipo de pensador livre é este que tem seus alicerces manipulados e para ser enxertado num estereótipo deve abandonar seus pensamentos? Que tipo de gótico abandona sua consciência em nome de um estereótipo?! O gótico é uma mente livre, cabe a ele e como ele vê a vida a decisão de servir a Satã, a Deus, Gautama Buda ou qualquer outra nume ou divindade! Esses góticos criam inúmeras regras para o goticismo, todas refletem sua experiência pessoal e jamais regra geral; e apenas tolos e posers seguem-nas, pessoas de mente realmente fraca, e de certo modo irracionais. Se não é ateu, não é gótico?! Afirmamos, se segue regrinhas e estereótipos tolos e irracionais não é gótico!
Na realidade, os godos (góticos) foram os povos que mais rapidamente assimilaram o cristianismo a sua cultura; sabe-se que os góticos do século XVIII eram cristãos, por mais que alguns deles fizessem menção à Satã ou a Natureza, e a maior parte dos góticos de hoje em dia veio de lares cristãos, querendo ou não, o cristianismo exerce uma grande influência em sua mentalidade. Para mim, o cristianismo é a religião que mais se liga ao goticismo, sendo o sonho concreto de cada gótico, mas falo disso depois.
Quanto a só vestir preto, ouvir música gótica, e ser depressivo; tudo está ligado ao gosto, estilo e personalidade de cada um. Devemos ressaltar apenas que a cultura é um subproduto da mente, da essência gótica; um gótico real sabe ser prudente no que busca. Em outras palavras, poderíamos ditar a regra: "nada de perder tempo com coisas que não vão desenvolver seu pensamento, sua visão, seus modos, sua cultura"; mas não devemos fazê-lo, pois poderíamos esquecer de nossa essência gótica, convertendo assim o goticismo num mero conjunto de regras tolas e irracionais, apenas a fim de enxertar ou enxotar pessoas de uma tribo urbana, formada por mentes medíocres.
Todos os motivos pelos quais alguns góticos só vestem roupas pretas, escutam este ou aquele estilo de música, são depressivos, fumam aquela marca de cigarro, bebem vinho, fazem tatuagens, são bissexuais, são homofóbicos ou jogam rpg, são considerações pessoais e jamais devem ser vistos como regras e etc., em contra partida, se não há um motivo real, considerando o seu agrado como um, não é subproduto da essência e sim regra manipulada, e isso é ser poser.
Muitos góticos carregam horríveis cicatrizes, mas, e é aí que se encontra a ironia, são motivados a continuar a busca por algo, justamente por isso alguns externam seus sentimentos, externam marcos que devem ser memoráveis, marcos que os motivam, ou fazem tudo de modo a fugir da realidade, tudo para esquecer: fazem tatuagens, escrevem poesia, bebem vodka, ou só vestem preto.
Justamente pelos incontáveis e inimagináveis motivos que assombram a consciência de cada um, não podemos tratar ninguém com preconceito. Seja por sua religião, sexualidade, estilo de música favorito, ideologia ou qualquer outra fator. Que tipos de pensadores são os góticos que desprezam o pensamento e a consciência dos outros? Onde está o respeito pela liberdade ,mesmo que pela liberdade de escolha de ser manipulado, pelos outros? E pela natureza de cada um? Que divirjamos, e toleremos, jamais defendamos, mas respeitemos!
O goticismo pode ser resumido em uma pequena frase: "é a essência reflexiva, consciente, trágica e mórbida que faz do gótico o real gótico" a subcultura gótica é formada pelas produções e expressões de góticos reais, sendo residual.
Quanto ao suicídio, o gótico que suicida, ao meu ver, se revela um fracassado; não foi capaz de resistir diante do negro da vida e sucumbiu ao seu outono. Esta vida jamais deve ser o mais importante, mas desfazer-se dela é desfazer-se de sua natureza gótica; suicidar é destruir a essência gótica.wikepédia.
O Grande Silêncio.
Todos perguntaram, que aconteceu?
Sem perguntar se perguntavam todos
e começou-se a viver o veneno
sem saber como, da noite pro dia.
Deslizava-se no silêncio como
se fosse neve negra o pavimento,
os famintos ouvidos esperavam
sinal e não se ouvia
senão um surdo rumor numeroso:
eram tantas ausências que se uniam
umas com outras como um buraco
a outro buraco, e outro, outro e mais outro
vão fazendo uma rede, e essa é a pátria:
sim, de súbito a pátria foi uma rede,
todos foram envoltos no vazio,
numa rede sem fios que amarrava
os olhos, os ouvidos, mais a boca,
e já ninguém sentiu que não tinha
com que sentir, a boca
não tinha direito a ter uma língua,
os olhos não deviam ver a ausência,
o coração vivia emparedado.
Eu fui, eu estive, eu toquei as mãos,
levantei a taça da cor do rio
como pão defendido pelo sangue:
à sombra da honradez da humanidade
dormi e eram esplêndidas as folhas
como se uma árvore só resumisse
todos os crescimentos desta terra,
e fui, de irmão em irmão, bem recebido
com a nobreza nova e verdadeira
dos que com suas mãos postas na farinha
amassaram o novo pão do mundo.
No entanto ali estava nesse tempo
a presença tenaz, uma ferida
de sangue e sombra que nos acompanha:
o que passou, o silêncio e a pergunta
que não se abriu na boca, que morreu
na casa, no caminho, pela usina.
Alguém faltava, mas não poderia
a mãe, o pai, o irmão, e mais a irmã,
e olhar o vazio de uma ausência atroz:
o olhar do ausente era como um estigma:
e não poderia olhar o companheiro
ou perguntar, sem converter-se em ar,
e passar ao vazio, num de repente,
sem que ninguém notasse ou que soubesse.
P.Neruda.
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