sexta-feira, 29 de junho de 2012

À Descoberta de Mozart.


No ano de 2005 comemorou-se o 250º aniversário do nascimento de Mozart. Celebrou-se por toda a parte a vida e obra deste compositor algo enigmático, de quem muito se tem escrito e falado. Na maior parte das vezes repetem-se os mesmos pontos de vista, com pequenas diferenças. Este copia aquele e ambos dão assunto para que um terceiro escreva mais alguma coisa. Um dos lugares-comuns dos artigos sobre Mozart é a sua ligação à Maçonaria. Esta Instituição, na Áustria mozartiana, como na Baviera, estava profundamente inspirada na filosofia Rosacruz. Por outro lado, Mozart foi um grande amigo de Mesmer (1734 – 1815), um rosacruz. Esta amizade deu bons frutos, incluindo a união da ciência com a arte em sintonia com os ideais rosacrucianos.

Não vamos falar deste assunto, onde muito está por descobrir. Preferimos dar atenção a uma das suas maravilhosas obras: o motete Ave Verum Corpus1.

As composições mozartianas reproduzem sons do Coro Universal. Entre elas existem algumas obras-primas intemporais. Nele incluímos este maravilhoso motete. Pela sua simplicidade, pela sua concepção geométrica e matemática, encerra pérolas espirituais que nos elevam e libertam.

Esta obra foi composta a 17 de Junho, numa altura em que as forças da Natureza estão mais vigorosas, e no próprio ano em que Mozart chegaria ao fim da sua existência física. Nasceu para o “santo etéreo monte” em 5 de Dezembro de 1791, às portas do Inverno, estação em que tudo começa a ficar em repouso à espera da Primavera.

Foi nesta fase final que surgiram várias das geniais e inovadoras obras deste compositor. Algumas são fruto da sua amizade com Mesmer e nelas encontramos uma simbiose entre a arte e a ciência2. É o caso do Adágio e Rondó para harmónica de vidro, flauta, oboé, viola e violoncelo3. Trata-se de uma criação musical com a particularidade de influenciar positivamente os enfermos promovendo a sua cura. A Flauta Mágica e a Clemência de Tito, o Concerto para Clarinete em Lá e o Requiem, são outras obras do mesmo período, todas repletas de beleza, de alegria, de esperança, de melodia. Em A Flauta Mágica, onde existem muitas notas e símbolos rosacrucianos, Mozart eleva-nos para a criação da Fraternidade Universal consciente de que, embora ainda tivesse muito para oferecer, já estava próxima a “irmã morte”.

Em meados do referido ano de 1781, a esposa de Mozart estava grávida do sexto e último filho. Doente, encontrava-se a banhos na cidade termal de Baden, a 26 km a sudoeste de Viena onde o compositor trabalhava arduamente. Mozart sofria com a ausência da esposa como se vê nas cartas que lhe escreveu. Sentindo aproximar-se do fim da vida, mergulha na angústia e na ansiedade.

É neste ambiente, mui sucintamente retratado, que ele oferece à humanidade o Ave Verum Corpus, um louvor à glória de Cristo e de Deus. Inspirando-se em João Sebastião Bach e no neoplatonismo cristão, concebe-a para ser tocada e cantada na Festa do Corpo de Deus, a 19 de Junho desse ano. Dedica-a a Anton Stoll, amigo e director do Coro da Paróquia da referida cidade de Baden. Trata-se de uma obra orquestrada com simplicidade, destinada apenas para instrumentos de corda, órgão e coro, com apenas 46 compassos, ou seja 4+6=10=1: O número um simboliza a unidade da Vida; o dez (5x2), relaciona-se com a expressão da vida tal como se representa no pentagrama do símbolo rosacruz, em sintonia com a elevada missão de Cristo.

O texto original que serviu a Mozart é de autor medieval desconhecido do século XIV. É um hino com apenas oito versos e a sua própria melodia de cantochão, É frequentemente usado por diversos compositores: Schubert, Gounod, etc. A versão mais conhecida é, sem dúvida, a de Mozart. Estimula uma profunda meditação sobre a paixão de Cristo, a redenção da humanidade e a vitória da vida sobre a morte. Comendo durante dias, meses e anos o pão amargo do sofrimento, no auge de uma profunda angústia, Mozart alcança, através da música, as vibrações celestiais que reproduz como pode, e de modo tão singelo e tão repleto de beleza e de profundidade que nos desperta logo o sentimento da unidade da vida e a indiferença ao pavor da morte. Estando assim em sintonia com a vontade do Pai, a música do genial compositor austríaco já não é só dele: é sobretudo o reflexo da harmonia do Cristo Cósmico, onde as individualidades se fundem mas não se confundem.

No texto do primeiro verso lemos a palavra Ave, que muitos querem que seja o anagrama de Eva. O Ave Verum Corpus4 é um réquiem em miniatura: não dura mais que uns três minutos. Ave é uma palavra latina que se traduz por “eu te saúdo” ou, simplesmente, por “salve”.

Mozart, ao sentir a profundidade da Paixão veiculada no hino que exalta a vitória da vida sobre a morte e da luz sobre as trevas, aceitou serenamente a peregrinação terrena como um caminho breve que leva à vida superior, quer dizer, à nossa pátria comum, que é o mundo espiritual