contos sol e lua

contos sol e lua

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

A Voz do Silêncio.


Pior do que a voz que cala,
é um silêncio que fala.

Simples, rápido! E quanta força!

Imediatamente me veio à cabeça situações
em que o silêncio me disse verdades terríveis,
pois você sabe, o silêncio não é dado a amenidades.
Um telefone mudo. Um e-mail que não chega.
Um encontro onde nenhum dos dois abre a boca.

Silêncios que falam sobre desinteresse,
esquecimento, recusas.

Quantas coisas são ditas na quietude,
depois de uma discussão.
O perdão não vem, nem um beijo,
nem uma gargalhada
para acabar com o clima de tensão.

Só ele permanece imutável,
o silêncio, a ante-sala do fim.

É mil vezes preferível uma voz que diga coisas
que a gente não quer ouvir,
pois ao menos as palavras que são ditas
indicam uma tentativa de entendimento.

Cordas vocais em funcionamento
articulam argumentos,
expõem suas queixas, jogam limpo.
Já o silêncio arquiteta planos
que não são compartilhados.
Quando nada é dito, nada fica combinado.

Quantas vezes, numa discussão histérica,
ouvimos um dos dois gritar:
"Diz alguma coisa, mas não fica
aí parado me olhando!"

É o silêncio de um, mandando más notícias
para o desespero do outro.

É claro que há muitas situações
em que o silêncio é bem-vindo.
Para um cara que trabalha
com uma britadeira na rua,
o silêncio é um bálsamo.
Para a professora de uma creche,
o silêncio é um presente.
Para os seguranças de um show de rock,
o silêncio é um sonho.

Mesmo no amor,
quando a relação é sólida e madura,
o silêncio a dois não incomoda,
pois é o silêncio da paz.

O único silêncio que perturba,
é aquele que fala.

E fala alto.

É quando ninguém bate à nossa porta,
não há emails na caixa de entrada
não há recados na secretária eletrônica
e mesmo assim, você entende a mensagem.
Martha Medeiros.

Sombras Abstratas.


O vento sopra a face com sensaçao de liberdade
Chegam as sombras roubando o doce azul
...deixando as cinzas
O medo tras a dor e a dor tras o medo
Dependentes um do outro
Inseparaveis ate o fim
O casal de lagrimas
Donos das feridas sangrentas
Sedentas de esperança
...luz do espirito
Refugio da alma
Guia da memoria
Descanso chamado morte?
Ou será que pode-se viver na morte,
sendo algo que permanesce vivo?!
[D.A]

Como dar vida às nossas vidas.


Há um antigo ditado japonês:
"Se houver relacionamento, faço; se não houver relacionamento, saio".
Um Mestre Zen, no final do século passado, fez a seguinte alteração:
"Havendo relacionamento, faço; não havendo, crio relacionamento".
Essa mudança de paradigma é extremamente importante. Devemos também lembrar que criar um relacionamento não significa, necessariamente, obter resultados imediatos, embora muitas vezes estes ocorram.
Novos relacionamentos em padrões antigos perdem seu significado. Precisamos criar relacionamentos a partir de novas maneiras de nos relacionar, de ver o mundo, de ser, de inter ser. Essa nova maneira pode, inclusive, recarregar de energia positiva antigos relacionamentos.
Para descobrirmos novas maneiras precisamos, primeiramente desenvolver a capacidade de perceber como estão nossos relacionamentos atuais.
Observe e considere meticulosamente a si mesmo. Perceba como está se relacionando em casa, na rua, no trabalho, no lazer. Perceba como respira, como anda, como toca nos objetos, como usa sua voz, como são seus gestos e como são seus pensamentos e os não pensamentos. Esse observar não deve ser limitante, constrangedor, confinador. Apenas observe. Como você se relaciona com o meio ambiente, biodiversidade, reciclagem, justiça social, melhor qualidade de vida, guerras, violência, terror, paz, harmonia, respeito, garantia dos Direitos Humanos? Como você e o seu logos se relacionam entre si e em relação aos projetos de sucesso, de lucro, de desenvolvimento e progresso de sua organização?
Como está se relacionando com o mais íntimo de si mesmo, com a essência da Vida, com o Sagrado?
Será que é capaz de ver, ouvir, sentir e perceber a rede de inter relacionamentos de que é feita a vida? Percebe e leva em consideração, na tomada de decisões, a interdependência?
Tanto individualmente, como no coletivo, nossa participação e compreensão como estão? Será que estamos conscientemente vivendo nossas vidas e direcionando nossos pensamentos, ações e palavras para o sentido de mudança que queremos e sonhamos?
Mahatma Gandhi disse: "Temos de ser a transformação que queremos no mundo".
Geralmente pensamos no mundo como alguma coisa distante e separada de nós, mas nós somos a vida do universo em constante movimento. Podemos até dizer que o mundo somos nós. Nossa vida forma o mundo, é o mundo, não apenas está no mundo. Inclui todas as formas de vida e seus derivados e nos inclui neste instante, instante após instante. Há um monge chinês do século VII, Gensha Shibi , que dizia : "O Universo é uma jóia arredondada. Somos a vida desse universo em constante transformação. Nada vem de fora, nada sai para fora".
De momento a momento tudo está mudando, nós fazemos parte dessa mudança e podemos escolher, discernir qual o caminho que queremos dar a esse constante transformar. É por isso que digo que a transformação começa em nós. Na verdade vai além de apenas começar. É em nós. Nossa capacidade humana de inteligência e compreensão nos permite fazer escolhas. E o que estamos escolhendo?
Outra frase de Mahatma Gandhi:
"Quando uma pessoa dá um passo em direção à Paz, toda a humanidade avança um passo em direção à Paz"
A minha decisão, a sua decisão pode transformar ou influenciar a direção da mudança.
Há um sutra budista que descreve o mundo como uma rede de inter relacionamentos. Como se fosse uma imensa teia de raios luminosos e em cada intersecção uma jóia capaz de receber essa luz e emitir raios em todas as direções. Qualquer pequena mudança afeta o todo. Cada ser que se transforme em um ser de paz, de harmonia, de ternura, carinho e respeito pela vida em todas as suas formas estará sendo uma mudança viva e influenciando tudo e todos.
Qual o primeiro passo? Conhecer a si mesmo. Conhecer nossos mecanismos.
O que nos afeta, nos incomoda? O que nos alegra? O que nos irrita? Como transformar a raiva em compaixão? Como transformar o desafio em competição leal, justa, empreendedora, enriquecedora? Sem nos preocuparmos com os créditos, se formos capazes de fazer o bem, não fazer o mal, fazer o bem aos outros estaremos transformando nossos lares, nossas amizades, nosso ambiente de trabalho, nossas organizações, nossas cidades, estados, países, nações, mundo e a nós mesmos no florescimento da Cultura da Paz.
"Estudar o Caminho de Buda é estudar a si mesmo. Estudar a si mesmo é esquecer-se de si mesmo. Esquecer-se de si mesmo é ser iluminado por tudo que existe. Transcender corpo e mente seu e dos outros. Nenhum traço de iluminação permanece e a Iluminação é colocada à disposição de todos os seres." (Mestre Zen Eihei Dogen - 1200-1253)
É importantíssimo que iniciemos este "estudar a si mesmo", já. Cada um de nós que perceber seu próprio mecanismo ficará em controle desse mecanismo e não mais à mercê de seus sentimentos e emoções, desejos e frustrações, puxado, empurrado, espremido e puxando, empurrando, espremendo - envenenados pela ganância, raiva e ignorância.
Imagine um mundo aonde podemos brilhar uns para os outros, sem ódios, mas com carinhoso respeito e terna compreensão. Percebendo nossas diferenças, aceitando a diversidade da vida e juntando nossas capacidades tanto intelectuais como físicas na construção desse verdadeiro Céu, Paraíso, Terra Pura, Shambala de que falam as religiões, todas elas.
Cabe a nós, a cada um de nós criar esse relacionamento de carinho com a vida, de ternura com todos os seres, de compreensão, de sabedoria e compaixão para percebermos o Caminho Iluminado e o Nirvana permeando toda a existência.
Isso é dar vida à nossa própria vida.
Haverá explicação e prática da meditação sentada e caminhando, exercícios de plena atenção, momentos de pausa e de reflexão a fim de desenvolver a percepção de si mesmo, do outro e do meio ambiente, de como agimos, reagimos atualmente - nosso relacionamentos - e do que seria conveniente fazer para ocorrer mudanças (caso as considerem necessárias) ou direcionar transformações individuais e coletivas.
Monja Coen.

O Rio dos Sentimentos.


N ossos sentimentos desempenham um papel muito importante por dirigirem todos os nossos pensamentos e ações. Existe em nós um rio de sentimentos, no qual cada gota d'água é um sentimento diferente e cada um depende de todos os outros para sua existência. Para observar esse rio, sentamo-nos à sua margem e identificamos cada sentimento à medida que ele vem à tona, passa por nós e desaparece.
Há três tipos de sentimentos — agradáveis, desagradáveis e neutros. Quando temos um sentimento desagradável, podemos querer afastá-lo. O mais eficaz é voltar à nossa respiração consciente e apenas observá-lo, identificando-o em silêncio para nós mesmos. "Inspirando, sei que há um sentimento desagradável em mim. Expirando, sei que há um sentimento desagradável em mim." Chamar o sentimento pelo seu nome, "raiva", "tristeza", "alegria" ou "felicidade", nos ajuda a identificá-lo com clareza e reconhecê-lo em maior profundidade.
Podemos usar nossa respiração para entrar em contato com nossos sentimentos e aceitá-los. Se nossa respiração for leve e tranqüila — resultado natural da respiração consciente — nossa mente e nosso corpo irão lentamente se tornando leves, tranqüilos e claros. E da mesma forma nossos sentimentos. A observação plenamente consciente se baseia no princípio da "não-dualidade": nosso sentimento não está separado de nós nem foi causado apenas por algo externo a nós. Nosso sentimento é nosso eu, e temporariamente nós somos esse sentimento. Não submergimos nesse sentimento, nem nos aterrorizamos com ele, tampouco o rejeitamos. Nossa atitude de não nos agarrarmos aos nossos sentimentos e de tampouco rejeitá-los é a atitude de desapego, uma parte vital da prática da meditação.
Se encararmos nossos sentimentos desagradáveis com cuidado, afeição e não-violência, podemos transformá-los naquele tipo de energia que é saudável e que tem a capacidade de nos nutrir. Através da observação consciente, nossos sentimentos desagradáveis podem ser muito esclarecedores para nós, proporcionando-nos revelações e compreensão a respeito de nós mesmos e da nossa sociedade.
A não-cirurgia.
A medicina ocidental dá ênfase demais à cirurgia. Os médicos querem eliminar o que não for desejável. Quando temos algum distúrbio no corpo, eles muitas vezes nos aconselham uma operação. O mesmo parece se aplicar à psicoterapia. Os terapeutas pretendem nos ajudar a descartar o que é indesejável e manter somente o que é desejável. Mas o que sobra pode não ser muito. Se tentarmos nos livrar do que não queremos, podemos nos livrar da maior parte de nós mesmos.
Em vez de agir como se pudéssemos nos desfazer de partes de nós mesmos, deveríamos aprender a arte da transformação. Podemos transformar nossa raiva, por exemplo, em algo mais salutar, como a compreensão. Não precisamos de cirurgia para eliminar nossa raiva. Se nos enfurecermos com nossa raiva, teremos duas raivas ao mesmo tempo. Devemos apenas observá-la com amor e atenção. Se cuidarmos da nossa raiva dessa forma, sem tentar fugir dela, ela se transformará. E uma pacificação. Se estivermos em paz em nosso íntimo, poderemos aceitar nossa raiva. E possível tratar a depressão, a ansiedade, o medo ou qualquer sentimento desagradável dessa mesma forma.
Transformando os sentimentos.
O primeiro passo ao lidar com os sentimentos é reconhecer cada sentimento no instante em que surge. O meio para isso é a plena consciência. No caso do medo, por exemplo, você recorre à plena consciência, olha para o medo e o reconhece como medo. Você sabe que o medo brotou de você mesmo e que a plena consciência também brotou de você mesmo. Os dois estão em você, não em luta, mas um cuidando do outro.
O segundo passo consiste em se tornar uno como sentimento. Melhor não dizer, "Vá embora, Medo. Não gosto de você. Você não é eu." Muito mais eficaz é dizer, "Oi, Medo. Como é que você está hoje?" Em seguida, você pode estimular esses seus dois aspectos, a plena consciência e o medo, a se cumprimentarem como amigos e a se unirem. Isso pode parecer assustador, mas, como você já sabe que você é mais do que seu medo, não é preciso se amedrontar. Desde que sua mente esteja alerta, ela fará companhia ao seu medo. A prática fundamental é nutrir a plena consciência com a respiração consciente, para mantê-la alerta, cheia de vida e força. Embora no inicio sua plena consciência possa não ser muito potente, se você a alimentar, ela se tornará mais forte. Contanto que a sua consciência esteja plena e presente, você não será submerso pelo medo. Na realidade, você começará a transformá-lo no exato instante em que dentro de si der à luz a percepção.
O terceiro passo é o de acalmar o sentimento. Como a consciência plena está cuidando bem do seu medo, ele começa a acalmar-se. "Inspirando, acalmo as atividades do corpo e da mente." Você acalma seu sentimento só por estar com ele, como uma mãe segurando ternamente o filhinho que chora. Ao sentir a ternura da mãe, o neném se acalma e pára de chorar. A mãe é sua mente alerta, nascida das profundezas da sua consciência, e ela tratará do sentimento da dor. A mãe que segura o bebê forma uma unidade com ele. Se a mãe estiver pensando em outras coisas, a criancinha não se acalmará. A mãe tem de abandonar as outras coisas e apenas segurar seu filhinho. Por isso, não evite seu sentimento. Não diga, "Você não é importante. Você é só um sentimento." Passe a formar uma unidade com ele. Você pode dizer, "Expirando, acalmo meu medo."
O quarto passo é largar o sentimento, soltá-lo. Graças à sua calma, você está à vontade, mesmo em meio ao medo; e sabe que esse medo não vai crescer e se transformar em algo esmagador. Quando você se descobre capaz de tomar conta do seu medo, ele já está reduzido a um mínimo, tornando-se mais brando e menos desagradável. Agora você pode sorrir para ele e deixá-lo partir, mas por favor não pare por aqui. Acalmar e largar um sentimento são apenas curas para os sintomas. Você agora tem a oportunidade de se aprofundar e trabalhar na transformação da raiz do seu medo.
O quinto passo é olhar profundamente. Você examina em profundidade o seu bebê — seu sentimento de medo — para ver o que está errado, mesmo depois que o bebê parou de chorar, mesmo depois que o medo se foi. E impossível segurar uma criança no colo o tempo todo. Por isso, você deve examiná-la para ver a causa do que está errado. Com esse exame, você verá o que o ajudará a começar a transformar o sentimento. Você perceberá, por exemplo, que seu sofrimento tem muitas causas, internas e externas ao seu corpo. Se há algo de errado em volta dele, se você conserta a situação, com carinho e cuidado, ele se sentirá melhor. Ao examinar seu bebê, você verá os elementos que o estão fazendo chorar. Ao vê-los, você saberá o que fazer e o que não fazer para transformar o sentimento e se sentir livre.
Esse processo é semelhante ao da psicoterapia. Em companhia do paciente, o terapeuta observa a natureza da dor. Muitas vezes, o terapeuta pode revelar causas de sofrimento que se originam da forma pela qual o paciente encara a vida, das opiniões que ele tem sobre si mesmo, sobre a sua cultura e o mundo em geral. O terapeuta examina esses pontos de vista e essas opiniões com o paciente, e juntos eles colaboram para libertá-lo daquele tipo de prisão em que estava. No entanto, o esforço do paciente é crucial. O professor deve trazer à luz o professor que existe dentro do aluno; e o psicoterapeuta deve trazer à luz o psicoterapeuta que está no íntimo do seu paciente. O "psicoterapeuta interno" do paciente poderá então trabalhar em tempo integral de uma forma muito eficaz.
O terapeuta não trata do paciente simplesmente lhe repassando um outro conjunto de opiniões. Ele tenta ajudar o paciente a perceber que tipos de idéias e de crenças levaram ao seu sofrimento. Muitos pacientes querem se ver livres dos sentimentos dolorosos, mas não querem se livrar das opiniões, dos pontos de vista que são as verdadeiras raízes dos seus sentimentos. Portanto, o terapeuta e o paciente têm que trabalhar juntos para ajudar o paciente a ver as coisas como elas são. O mesmo vale para quando recorremos à plena consciência para transformar nossos sentimentos. Depois de reconhecermos o sentimento, de nos tornarmos unos com ele, de o acalmarmos e de o largarmos, podemos examinar suas causas em profundidade. Elas muitas vezes se baseiam em percepções incorretas. Assim que compreendemos as causas e a natureza dos nossos sentimentos, eles começam a se transformar.
Monge Thich Nhat Hanh.
Do livro: Paz a cada passo - Como manter a mente desperta em seu dia-a-dia.
Editora: Rocco.