domingo, 22 de agosto de 2010
O Destino dos Filhos de Lir.
Os cinco reis da Irlanda reuniram-se um dia para eleger, dentre eles, um grande rei de Erin. Os seus nobres escolheram Dearg, filho de Daghda, por ser o filho mais velho de um druida altamente respeitado. Contudo, o rei Lir deixou a reunião real muito irritado, pois esperara para si próprio essa alta distinção.
Os outros reis quiseram cavalgar atrás dele e feri-lo com a espada e com a lança devido à sua traição, mas Dearg deteve-os. De forma a manter a paz, disse: faremos dele nosso parente, dando-lhe a saber que pode escolher para esposa uma das três lindas filhas de Oilell de Aran, meu próprio filho adotivo.
Foram enviados mensageiros para a colina de White Field, onde o rei Lir tinha a sua corte. Este aceitou a oferta e, no dia seguinte, partiu com cinquenta carroças para o lago do Olho Vermelho, perto de Killaloe. O rei Dearg estava lá à sua espera, juntamente com as três filhas de Oille. Toma a donzela que desejares, qualquer que seja, disse Dearg.
Não posso decidir qual delas é a mais bonita, responder Lir, e por isso, levarei a mais velha, pois ela é a mais nobre. A donzela Ove é a mais velha das três, e é tua se assim o desejas, disse Dearg.
Lir regressou à colina de White Field, com Ove como sua noiva. Pouco tempo depois nasceram uma filha e um filho gêmeos, Fingula e Aod eram os seus nomes. Mais dois filhos se seguiram, Fiachra e Conn, mas o nascimento deles levou à deplorável morte de Ove. Contudo, Lir amara ternamente a sua mulher e o seu coração não teria resistido se não fosse o igual amor que sentia pelos seus quatro filhos.
Imagem de John DuncanQuando recebeu a notícia, o rei Dearg sentiu muito a dor de Lir, pelo que enviou mensageiros para lhe oferecer a mão de Oifa, irmã de Ove, como segunda esposa. Casaram e viveram felizes durante algum tempo. Porém, Oifa começou a ter ciúmes das crianças, que eram amadas por toda a gente. Assim, levou-as a passear de carroça, tendo em mente intentos perversos. Fingula resistiu, pois na noite anterior, sonhara coisas terríveis a respeito da sua madrasta; porém o seu destino estava marcado e ela entrou na carroça.
Os cinco chegaram ao lago dos Carvalhos. Dar-vos-ei aquilo que mais desejarem neste mundo, gritou Oifa para a gente que ali habitava, se matarem os quatro filhos de Lir. Todavia, ninguém quis nada com ela. Então, disse às crianças que fossem nadar no lago, lançando-lhes um encantamento com uma varinha que um druida lhe oferecera certa vez. E enquanto apontava a varinha, cantou as palavras mágicas por sobre as águas e lançou correntes de prata, que se enrolaram nos pescoços das crianças:
Nas águas selvagens, real Progênie de Lir!
Para todo o sempre os vossos
Gritos ficarão perdidos entre as aves.
As quatro crianças começaram imediatamente a ficar cobertas de penas macias e, em breve, se tornaram lindos cisnes da mais pura brancura.
Fingula cantou: Conhecemos-te por aquilo que és, mulher bruxa!
Tens poderes para nos fazer nadar no lago,
Ainda que possamos descansar em terra quando quisermos;
Nós seremos acariciados, mas tu serás censurada.
Embora nos vejas agora sobre as ondas,
Os nossos espíritos estão a caminho de casa.
Retira a maldição que sobre nós lançaste, gritou Fingula. Nunca! Exclamou Oifa, rindo. Não até que Lairgnen de Connaught case com Deoch de Munster e as mulheres do Sul se unam aos homens do Norte. Durante novecentos anos terão de sulcar os lagos e rios de Erin e ninguém será capaz de retirar o meu encantamento. Uma coisa vos concedo: conservarão a fala do homem e nenhum homem ou animal ouvirá o vosso áspero cantar. Disse isto sem qualquer remorso; depois cantou:
As nossas saudações ao grupo de cavaleiros
Que se aproxima do lago do Olho Vermelho,
Estes não são homens de encantamento e podem
Procurar tirar-nos das águas.
Então dirijam-se para a margem, irmãos Aod,
Fiachra e formoso Conn,
Pois estes não são cavaleiros estranhos
Mas nosso pai, o rei Lir, e os seus homens.
Lir ouviu as maravilhosas vozes humanas dos cisnes e perguntou os seus nomes. Nós somos os filhos de Lir, gritaram. A nossa madrasta lançou sobre nós uma cruel maldição, como todos podem ver, e esta não pode ser levantada até ao casamento de Lairgncn e Deoch.
Os cisnes cantaram as suas selvagens e míseras baladas. Lir e os seus acompanhantes choraram e enfureceram-se, até que os cisnes acabaram por voar para longe. Logo a seguir, Lir fez-se a caminho para o palácio de Dearg e contou-lhe a perfídia da sua segunda mulher. Que criatura, perguntou Dearg a Oífa, gostarias menos de ser neste mundo de figuras e formas?
Bem, repondeu ela, qualquer pessoa odiaria ser transformada em um demônio do ar.
Então, torna-te num deles, disse Dearg, apontando sua varinha para Oifa. O rosto desta tornou-se imediatamente demoníaco e as asas afiladas levaram-na para o ar, para ali ficar como demônio, até ao fim dos tempos.
Os filhos de Lir entoaram as suas canções de pesar aos clãs que habitavam em redor do lago do Olho Vermelho, até acharem que chegara a altura de partir. Enquanto se mantiveram nas margens do lago, Fingula cantou para a gente de Dearg e de Lir:
Faz o bem, Dearg nosso rei,
Tu que dominaste a arte dos druidas!
E faz o bem, nosso pai querido,
Rei Lir da colina de White Field!
Nós vamos partir para viver os nossos últimos dias,
Muito longe das habitações dos homens.
Nadaremos nas mates cheias do Moyle,
Com todas as penas frias e salgadas.
Até esse dia em que Deoch se junte a Lairgnen,
Voemos, meus irmãos, que já tivemos faces coradas;
Do lago do Olho Vermelho partiremos;
Com pesar voaremos para longe dos nossos entes queridos.
Partiram, voando alto pelo céu, a perder de vista, e não descansaram até chegarem a Mooyle, o lençol de água que está entre Erin e Alba. E a gente de Erin ficou tão triste com a partida dos meninos-cisne, que decretou uma lei que proibiu a morte de cisnes.
As crianças encontraram-se, geladas e sozinhas, no meio de uma enorme tempestade. Fingula sugeriu que combinassem um ponto de encontro, para o caso de se perderem na tempestade. Reunir-nos-emos, disse a seus irmãos, no rochedo das Focas.
Ao dizer isto, um relâmpago e um trovão atiraram os filhos de Lir para longe uns dos outros, perdidos na intensa tempestade. Quando finalmente esta amainou, Fingula cantou:
Desejei ter morrido nas bravias águas
Pois as minhas asas transformaram-se em gelo.
Meus três irmãos, voltem de novo
E escondam-se uma vez mais debaixo das minhas asas.
Mas eu sei que isto nunca poderá acontecer
Até que os mortos se levantem das suas sepulturas!
Pôs-se a caminho do rochedo das Focas, e apareceram dois dos seus irmãos, Conn e Fiachra, com as penas pesadas pelo sal que o mar tempestuoso atirara sobre elas. Fingula aconchegou-os debaixo das suas asas. Se, pelo menos, o nosso irmão Aod estivesse aqui conosco, gritou, então estaríamos felizes. Aod chegou com a cabeça e as penas secas e lisas. Fingula cobriu-o com o peito, tendo Conn e Fiachra debaixo de cada uma das asas, e cantou:
As palavras mágicas de uma mulher malvada
Enviaram-nos para os mares setentrionais,
Transformados pela nossa madrasta somos
Formas mágicas de cisnes.
E agora a nossa banheira é a crista da água
Na espuma salgada do rebentar das ondas
E a única cerveja que bebemos durante a festa
E o trago salgado do profundo mar azul.
Um belo dia, um grupo de reluzentes cavalos brancos chegou a galope e as crianças-cisne reconheceram os dois filhos de Dearg. O rei, nosso pai, disseram, e evidentemente, o vosso próprio pai Lir, estão vivos e bem, mas não se sentem felizes desde que voastes do lago do Olho Vermelho. Fingula cantou então os seus destinos:
Esta noite há carne e bebida na corte,
Na corte de Lir há alegria.
Mas o que foi que aconteceu aos filhos de Lir?
As nossas camas são as nossas penas,
A nossa comida é a areia branca,
O nosso vinho é o profundo mar azul.
Debaixo das minhas penas descansam Fiachra e Conn,
Sob as minhas asas nadam no Moyle,
E debaixo do meu peito descansa o querido Aod.
Juntos descansamos na nossa cama de penas.
Os filhos de Dearg regressaram, contaram o que tinham visto e falaram da linda canção que tinham ouvido. As correntes do Moyle levaram os filhos de Lir para a baía de Erris, onde permaneceram até ao dia fadado em que tiveram de regressar à colina de White Field. Encontraram tudo num estado de desolação; só havia urtigas onde, outrora, se erguiam as altas paredes das casas. Por três vezes gritaram a sua dor. Então, mais uma vez, Fingula cantou:
Que triste é para mim ver
As casas em ruínas de meu pai.
Houve aqui outrora cães de guarda e cães de caça,
Aqui as mulheres riam com os galantes cavaleiros,
Aqui ouviu-se outrora o entrechocar dos copos
De chifre ou madeira nas festas felizes,
Agora, tudo o que vejo é desolação
Desde que há muito meu pai morreu e partiu.
E nós, seus filhos, vagueamos durante anos,
E sentimos a cruel rajada dos ventos gélidos;
Mas chegou agora o mais cruel de todos os golpes,
Regressar finalmente a uma casa vazia.
Em seguida, os cisnes voaram para as encantadoras ilhas do Oeste. Por essa altura, a profecia da canção de Fingula tornou-se verdadeira. Deoch, a princesa de Munster, prometeu casar com Lairgnen, príncipe de Connaught. Todavia, Deoch não casaria até que o seu príncipe lhe trouxesse os maravilhosos cisnes.
Eairgnen encontrou-os a nadar alegremente no lago das Aves; remou até eles e retirou-lhes as correntes de prata. Num instante, tornaram-se novamente humanos, mas os rapazes tinham crescido e eram agora homens velhos e a jovem Fingula uma velha magra encurvada. Morreram, passada uma hora, e foram deixados a descansar como tinham estado em vida. Fiachra e Conn, um de cada lado de Fingula, e Aod debaixo do seu peito.
Fonte bibliográfica:
Introdução à Mitologia Céltica - David Bellingham
Os Contos Celtas.
Os contos e os mitos do mundo céltico são na maioria, da Idade do Ferro do Ciclo de Ulster, antigo Ulaid, e estão graficamente preservados em vários textos, que vão desde o antigo Lebor Gabála Érenn (O Livro das Conquistas) ao Mabinogion, uma coletânea de manuscritos escritos em prosa, no galês medieval e nas tradições dos primeiros contadores de histórias irlandesas, conhecidos também como bardos.
Estas histórias serviam como elemento de educação para os jovens da nobreza céltica, pois seus personagens heróicos forneciam um modelo de comportamento guerreiro, próprio para juventude da época. Contudo, os mitos também forneciam representações lendárias de personagens reais, cujos atos são tão marcantes que foram preservados tanto na poesia bárdica como na memória popular.
Mesmo com a chegada do cristianismo, os contos orais não puderam ser destruídos, mas acabaram sendo adaptados ou cristianizados, onde antigos Deuses celtas tornaram-se um único Deus e sacerdotes druidas da Velha Religião foram substituídos pelos atuais santos católicos.
Sendo que, o maior prodígio destas histórias são indiscutivelmente o fato de terem sobrevivido, durante séculos afora, e fornecerem até os dias de hoje informações sobre esse rico e encantador mundo celta, para que assim, possamos transmiti-los às gerações futuras, preservando um pouco da sua cultura.
A história dos celtas mantêm-se vívida, até os dias hoje, através da memória ancestral dos seus mitos. Eis, alguns destes contos... Bênçãos plenas e boa leitura a todos!
Powena Arnehoy Seneween
O Credo das Bruxas.
Ouça agora a palavra das Bruxas,
os segredos que na noite escondemos,
Quando a obscuridade era caminho e destino,
e que agora à luz nós trazemos.
Conhecendo a essência profunda,
dos mistérios da Água e do Fogo,
E da Terra e do Ar que circunda,
Manteve silêncio o nosso povo.
O eterno renascimento da Natureza,
A passagem do Inverno e da Primavera,
Compartilhamos com o Universo da vida,
que num Círculo Mágico se alegra.
Quatro vezes por ano somos vistas,
no retorno dos grandes Sabbats,
No antigo Halloween e em Beltane,
ou dançando em Imbolc e Lammas.
Dia e noite em tempo iguais vão estar,
ou o Sol bem mais perto ou longe de nós,
Quando, mais uma vez, Bruxas a festejar,
Ostara, Mabon, Litha ou Yule saudar.
Treze Luas de prata cada ano tem,
e treze são os Covéns também,
Treze vezes dançar nos Esbaths com alegria,
para saudar a cada precioso ano e dia.
De um século à outro persiste o poder,
Que através das eras tem sido levado,
Transmitido sempre entre homem e mulher,
desde o princípio de todo o passado.
Quando o círculo mágico for desenhado,
do poder conferido a algum instrumento,
Seu compasso será a união entre os mundos,
na terra das sombras daquele momento.
O mundo comum não deve saber,
e o mundo do além também não dirá,
Que o maior dos Deuses se faz conhecer,
e a grande Magia ali se realizará.
Na Natureza, são dois os poderes,
com formas e forças sagradas,
Nesse templo, são dois os pilares,
que protegem e guardam a entrada.
E fazer o que queres será o desafio,
como amar a um amor que a ninguém vá magoar,
essa única regra seguimos à fio,
para a Magia dos antigos se manifestar.
Oito palavras o credo das Bruxas enseja:
sem prejudicar a ninguém, faça o que você deseja.
[D.A]
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