contos sol e lua

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domingo, 4 de julho de 2010

Vendendo sua Alma a Santanás (continuação)


Por estar aborrecido, Fausto responde com desdém à exigência de Lúcifer de assinar com sangue o pacto entre eles e, então, profere as seguintes palavras:
"Não temas que faltar à minha palavra eu vá.
O propósito de toda a minha energia
Em inteira concordância com meu juramento está.
Levianamente, muito alto tenho aspirado;
Estou no mesmo nível que tu;
Eu, o Grande Espírito escarnecido; desafiado.
A própria Natureza se escondeu de mim.
Rasgada está a teia do pensamento; minha mente
Abomina toda a classe de conhecimento.
Nas profundezas. de prazeres sensuais mergulhadas
Deixemos ficar nossas paixões incendiadas,
Envoltas nos abismos de mágicos véus formosos,
E que nossos sentidos vibrem em encantos assombrosos".
Tendo sido desdenhado pelas forças que conduzem ao bem e estando completamente dominado pelo desejo de obter conhecimento direto e de verdadeiro poder, está disposto a ir até as últimas conseqüências. Mas Deus está sempre presente, como foi dito no prólogo:
"Um homem bom em sua mais escura aberração,
Conhece ainda o caminho que o conduz à salvação".
Fausto é a alma aspirante, e a alma não pode ser permanentemente desviada do caminho da evolução.
A declaração de Fausto sobre seu objetivo corrobora,a afirmação de que ele tem um ideal elevado, mesmo quando chafurda na lama. Ele quer experiência:
"O fim que eu aspiro não é o prazer.
Agonizante bem-aventurança - eu anseio por realização.
Ódio enamorado, rápido aborrecimento.
Purgado do amor do saber, minha vocação.
De hoje em diante, o objetivo de todos os meus poderes vai ser
Livrar meu peito de toda angústia, conhecer
Todo o infortúnio e o bem estar humanos no âmago do meu coração.
O sublime e o profundo em pensamento abraçar,
Os vários destinos do homem em meu peito acumular".
Antes que alguém possa ser realmente compassivo, deve sentir, como Fausto também o deseja, tanto a profundidade das tristezas da alma humana como suas elevadas alegrias; pois, somente quando conhecemos estes extremos dos sentimentos humanos podemos sentir a compaixão necessária por aqueles que precisam ser ajudados, e assim colaborar na elevação da humanidade. Através de Lúcifer, Fausto é capaz de conhecer tanto a alegria como a tristeza. Lúcifer também admite isto quando diz:
"A força que mesmo o mal planejando
Para o bem está trabalhando".
Pela interferência dos Espíritos de Lúcifer no esquema da evolução, as paixões da humanidade foram despertadas, intensificadas e conduzidas para um canal que tem causado todas as tristezas e enfermidades no mundo. Não obstante, isso despertou a individualidade no homem e libertou-o das condições liderantes dos Anjos. Fausto, pela ajuda de Lúcifer, é afastado dos caminhos convencionais, tornando-se assim individualizado. Quando o pacto entre Fausto e Lúcifer foi concluído, tivemos a réplica dos Filhos de Caim, que são os descendentes e protegidos dos Espíritos de Lúcifer, como vimos em "Maçonaria e Catolicismo".
Na tragédia de Fausto, Margarida é a protegida dos Filhos de Seth, o clero, descrito na lenda Maçônica. No momento, as duas classes representadas por Fausto e Margarida devem defrontar-se, e entre elas será encenada a tragédia da vida. Em conseqüência das desgraças sofridas por elas, a alma criará asas que a elevarão novamente aos reinos das bem-aventuranças de onde veio. Nesse ínterim, Lúcifer leva Fausto à cozinha das bruxas onde ele vai receber o elixir da juventude, para que, rejuvenescido, possa tornar-se desejável aos olhos de Margarida.
Quando Fausto aparece no palco, a cozinha das bruxas está repleta de instrumentos que são usados em magia. Um fogo infernal queima sob uma chaleira onde são preparadas as poções de amor, e há aí muito mais coisas fantásticas. Observamos vários objetos inanimados, mas o que mais desperta a nossa atenção é uma família de macacos, a qual tem um grande significado porque representa uma fase da evolução humana.
A humanidade, satisfeita com a paixão instigada pelos Espíritos de Lúcifer ou Anjos caídos, libertou-se da hoste angelical liderada por Jeová. Como conseqüência desse obstinado desejo, foram logo envolvidos por "revestimentos de pele" e separados uns dos outros. O egoísmo suplantou o sentimento de fraternidade, atingindo o nadir do materialismo. Alguns foram mais passionais que outros. Por isso, seus corpos cristalizaram-se mais. Eles degeneraram e tornaram-se antropóides. Seu tamanho foi reduzido à medida que se aproximavam do limite onde a espécie devia ser extinta. Eles são, portanto, os pupilos especiais dos Espíritos lucíferos. Assim, o mito de Fausto mostra-nos uma fase da evolução humana não incluída na lenda Maçônica, e dá-nos uma visão mais completa e conjunta do que realmente aconteceu.
Houve uma época em que toda a humanidade passou pelo ponto onde os cientistas acreditam estar localizado o elo perdido. Os que agora são antropóides degeneraram a partir daquele ponto, enquanto a família humana evoluiu até o presente estágio de desenvolvimento. Sabemos como a indulgência para com as paixões embrutece aqueles que por elas se deixam levar. Podemos compreender prontamente que quando o homem estava ainda em formação, sem individualidade e sob controle direto das forças cósmicas, esta indulgência não era controlada pelo sentimento da individualidade que, de certo modo, nos protege hoje. Portanto, os resultados seriam naturalmente mais desastrosos e de maiores conseqüências.
Alguma vez, a alma aspirante deve entrar na cozinha das bruxas como o fez Fausto, e encarar o objetivo da lição que nos leva a considerar a conseqüência do mal, representada pelo macaco. A alma tem, então, permissão para encontrar-se com Margarida no jardim, para tentar e ser tentada, para escolher entre a pureza e a paixão, para cair como Fausto, ou permanecer firmemente na pureza, como fez Parsifal. Sob a Lei da Compensação receberá sua recompensa pelas ações praticadas no corpo. De fato, a sorte é irmã gêmea do merecimento, como Lúcifer mostra a Fausto, e a verdadeira sabedoria só se conquista com paciente perseverança na prática do bem.
"Quão ligada está a sorte ao merecimento,
Isso ao tolo jamais ocorreria.
Eu juro, tivesse ele a pedra do homem sábio,
A pedra do filósofo não seria".
Fiel a seu propósito de estudar a vida em vez de livros, Fausto pede a Lúcifer que consiga introduzi-lo na casa da Margarida. Tenta conquistar a afeição dela com um principesco presente de jóias, que Lúcifer introduziu às escondidas em seu armário. O irmão de Margarida está ausente, lutando por sua pátria. Sua mãe não é capaz de decidir o que fazer com o presente, e o leva ao seu guia espiritual na igreja. Este aprecia mais o brilho das gemas do que as preciosas almas a ele confiadas. Negligencia seu dever à vista de um colar de pérolas, mais ansioso em garantir as jóias para o adorno de um ídolo, do que defender uma filha da igreja contra o perigo moral que a cerca. Assim, Lúcifer vence e rapidamente recebe uma recompensa de sangue e, em seguida, de almas humanas. Para conseguir acesso aos aposentos de Margarida, Fausto a persuade a dar à sua mãe uma poção para dormir, o que causa a esta, a morte. Valentino, o irmão de Margarida, é morto por Fausto. Margarida é encarcerada e sentenciada a sofrer pena capital.
Quando uma semente adere à polpa de uma fruta ainda verde, é doloroso retirá-la de lá. Da mesma forma, o sangue, que é o assento da alma, está no corpo de uma pessoa e, quando esta encontra um fim súbito e prematuro, é fácil perceber o sofrimento de tal morte. Os Espíritos de Lúcifer deleitam-se com a intensidade do sentimento e evoluem através disso. Em relação ao objetivo, a natureza de uma emoção não é tão essencial quanto sua intensidade. Por isso, eles agitam as paixões humanas de natureza inferior, que são mais intensas em nosso presente estágio de evolução do que os sentimentos de alegria e amor. Como resultado, incitam à guerra e ao derramamento de sangue, e o que nos parece maligno agora, na realidade, são degraus para ideais mais nobres e elevados, pois, através da tristeza e do sofrimento, tais como foram gerados em Margarida, o Ego eleva-se cada vez mais na escala da evolução. Aprende o valor da virtude quando desliza na direção do vício.
Foi com verdadeira compreensão deste fato que Goethe escreveu:
"Quem nunca comeu seu pão em amargo afã,
Quem nunca, acordado, a meia-noite viu passar,
Chorando, esperando pelo amanhã,
Os Poderes celestiais não sabe ainda avaliar".
Max Heindel.

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