sábado, 8 de setembro de 2012

A dor da perda de ente querido.


As dores causadas pela morte de pessoas queridas vestem-se de infinitas maneiras. Cada um tem história a contar. Crianças que perdem os pais, pais que sepultam filhos, esposos amados que se separam pela espada da morte. Amigos que sentem o silêncio da ausência de alguém com quem partilhavam vida e afeto. Mas há cenas que ultrapassam a dor cotidiana das mortes anunciadas e esperadas, ou mesmo inesperadas, pela crucial violência. Recordo dois exemplos, um arrancado da memória bem passada e outro recente. Lá pelos idos da Segunda Mundial a insânia perversa do nazismo arrancou com violência uma multidão de crianças pequenas dos braços amorosos das mães, amontoando-as num vagão que as conduziu à morte no Campo de Concentração. O grito lancinante de dor das mães era somente abafado pelo vozerio estúpido dos brutais soldados e pelo choro desesperado das crianças. Cena lancinante! Crianças não foram feitas para morrer!

Talvez o leitor tenha visto e se lembre da tocante imagem daquela mulher com o rosto transtornado de dor e com os braços estendidos em direção aos quatro caixões dos três filhos assassinados pelo pai que depois se suicidara. Ali estava o fim de seus amores da terra. E diante de tanto sofrimento, que palavra humana temos? Somente o silêncio.

A primeira pergunta, que nos vem à mente, é a que o Papa Bento XVI, na visita ao campo de concentração de Auschwitz na Polônia, se fez: “Onde estava Deus naqueles dias? Por que Ele se calou então? Como pôde tolerar este excesso de destruição, este triunfo do mal?” Ousaria responder: misturando suas lágrimas divinas com as das mães.

Nenhuma cultura encontrou outra resposta para a morte a não ser sepultar com amor, cuidado e reverência os mortos. Antropólogos reconhecem no sepultamento os primeiros sinais de humanidade, separando-nos do mundo animal. O animal cai morto e aí fica. O ser humano é enterrado com ritos, símbolos e com orações fúnebres. Tudo pode terminar aí, mas mesmo assim o ser humano faz questão de sepultar seus semelhantes.

. Horácio, o poeta latino, acreditou que atravessaria o esquecimento da morte pela beleza dos versos. Sem modéstia, dizia que erguera com eles um “monumento mais perene que o bronze”. Assim lutam as culturas contra a morte, tão terrível ela parece ser. E os humanos do lado de cá tecem loas aos mortos, erguem-lhes mausoléus, dão-lhes os nomes a praças e ruas, enfim inventam mil artifícios para os reterem entre nós. Mas sabem que tudo isso não dá vida a ninguém além da morte. Atenua-se a dor imediata, fica a latente e profunda.

A fé judaica debateu-se durante séculos com tal problema. E a palavra revelada foi fazendo caminho pela história de um silêncio quebrado pela posteridade até chegar a luz luminosa da ressurreição, passando pela escuridão muda do sheol – lugar dos mortos. Viemos, nós cristãos, depois e na esteira de Israel. Nela nasceu Jesus e com a linguagem da ressurreição exprimiu com clareza o próprio destino depois da morte. “

Ressuscitou. Não está aqui, disse o anjo às mulheres. Essa mensagem ecoa no coração da fé cristã até o dia de hoje. Temos na fé somente duas palavras a dizer aos que sofrem com a ausência triste do morto querido. Deus é o primeiro a pôr-se ao lado do golpeado pela dor. E em gesto de solidariedade mostra-nos o Filho que lhe foi arrancado pela violência da maldade humana. É a solidariedade no sofrimento. E depois em gesto ulterior mostra o túmulo vazio. Já não se encontra lá, perdido na pura corrupção, no nada abissal. Vive e de vida em plenitude. Assim os mortos em Cristo – e esperamos que todos os nossos mortos o sejam – participam de igual vida. Todos que morremos em Adão ressuscitaremos em Cristo. Que a fé na ressurreição, se não consegue secar todas as lágrimas da terra, rasga, porém, horizonte de esperança e anuncia encontro na luz da eternidade.

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