domingo, 20 de setembro de 2009

Drácula, como o vampiro de LeFanu.



É um nobre de tempos antigos, com profundo desprezo pelo que parece ser a civilização em que vivem os leitores de Stoker. Com relação á sua morte, como nos lembra Melton, “Nem os poderes empossados, um forte herói aou a modena ciíncia puderam diminuir, muito menos impedir, a disseminação daquele mal. Não fosse a intervenção do devoto da sabedoria não-convencional e sobrenatural (Abraham Van Helsing), o mal teria se espalhado impunemente pelo centro do mundo civilizado e incrédulo”.
Vejamos se é possível acrescentar algo mais a essas considerações sobre Drácula. … interessante notar que, enquanto em Carmilla, por mais que a “sabedoria não-convencional” triunfe no fim, o que é apresentado ao leitor é uma situação que ocorre em um universo isolado do que na época seria considerado “o mundo real” ou algo que o valha. Ao colocar o vampiro, com todo o mal que ele representa, na Londres vitoriana, Stoker cria uma situação em que a própria estrutura social vigente era desafiada por um mal vindo de tempos antigos. Não queremos sugerir que haja em Drácula algo como uma postura política nas entrelinhas. O intuito aqui é apenas mostrar de que maneira o transporte da figura do vampiro para um ambiente mais familiar ao leitor foi um modo bastante eficiente de acentuar certos efeitos buscados á exaustão por autores góticos da época.
Tudo isso dito, vejamos o que se pode concluir sobre a evolução da figura do vampiro dos primeiros romances góticos até hoje. Em primeiro lugar, pode-se ver nitidamente que, nos primeiros escritos góticos, ele era uma figura que representava essencialmente um mal que podia se infiltrar na sociedade de maneira bastante insidiosa (é evidente até para o leitor mais casual de Drácula, Carmilla ou The Vampyre que eles eram certamente monstros, mas podiam se misturar com facilidade á vida social). Isso não pode ser confundido com a maneira pela qual muitas vezes os vampiros de histórias contempor‚neas, quase sempre tão humanizados, encarnam de maneira vivaz o desejo pela imortalidade.
A humanização do vampiro, aliás, talvez deva muito ao fato de vivermos em uma época em que a busca pela imortalidade seria uma alternativa para uma vida, por assim dizer, mais vazia de sentido. Com o enfraquecimento de várias instituições e, além disso, com a proliferação de filosofias niilistas, é comum que tenha mudado a maneira como as pessoas se relacionam com a morte e também com a religião. Isso nos leva a um outro ponto em que o vampiro da velha literatura gótica se diferencia do que vemos nas histórias atuais é o fato de ter havido, como já foi observado, uma descristianização do mito. Como vimos, o ajuste de contas com o cristianismo parece ser um aspecto importante tanto de Drácula quanto de Carmilla, e isso é algo que vemos muito pouco na literatura gótica atual. Ainda que escritores góticos contempor‚neos muitas vezes tratem de assumir em suas obras posturas bastante duras no que diz respeito á religião instituída, a própria figura do vampiro não parece ser concebida como um modo de simplesmente ajustar contas com a tradição cristã. Isso é particularmente visível no caso de St. Germain, que, como esperamos já ter mostrado, é concebido como uma criatura que toma o sangue das vítimas por motivos que tem, por parte de Chelsea Quinn Yarbro, inspiração inegavelmente pagã. De qualquer maneira, não se pode negar que, além da perda de influíncia por parte da Igreja sobre o que se pode ou não escrever, o fato de já haver algo como uma rejeição do cristianismo por parte dos vampiros que vemos na literatura gótica mais antiga certamente contribuiu para algo como um processo de descristianização.
- claro que não se pode negar que praticamente todas as lendas de vampiro, em qualquer lugar e época, compartilham algumas características. Todas elas, por exemplo, estão de algum modo relacionadas á morte. Além disso, a imensa maioria das figuras vampíricas nas lendas e na literatura tem grande predileção pela existíncia noturna, ou chega mesmo a ser bastante vulnerável á luz solar. No fim das contas, entretanto, talvez o que garanta a imensa longevidade do mito do vampiro seja justamente a capacidade que ele tem de se adaptar, de modo a representar, ainda que com algumas alterações, os maiores medos e ansiedades de praticamente qualquer grupo social.
Bibliografia:
LeFannu, Joseph Sheridan, "Carmilla"Melton,
J. Gordon, "O Livro dos Vampiros"
Punter, David, "The Literature of Terror"

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