quinta-feira, 19 de novembro de 2009

O Mistério da Morte.


Navegando sobre o delta do Nilo, Ísis removeu a tampa do caixão e chorou sobre o corpo do irmão-marido. Graças às lágrimas, por alguns instantes Osíris recuperou a vida – tempo suficiente para que Ísis engravidasse. Quando a barcaça aportou, a deusa preocupou-se em cuidar de seu prematuro filho Hórus, que nasceu ali nos pântanos. Ao afastar-se do esquife, Séti novamente se aproveitou e esquartejou o corpo de Osíris em 14 pedaços, espalhando-os pelo delta do Nilo. Ísis, ao dar-se conta do mal feito, pediu ajuda à sua irmã Néftis, também mulher de Séti, para remontar o corpo. As duas reencontraram as partes escondidas e Osíris, ora refeito, passou a reinar no mundo dos mortos. Seu filho, Hórus, logo resgataria no mundo dos vivos a glória de seu pai, ao derrotar Séti definitivamente, após uma interminável série de embates.
Curiosamente, descobertas arqueológicas encontraram em alguns túmulos da 19a dinastia, datados por volta de 1300 a.C., a figura de Osíris num caixão sobre o qual crescem ramos de trigo, milho ou cevada, idéia esta presente na cultura egípcia desde sua antigüidade tardia. No museu do Cairo, por exemplo, há múmias sobre as quais foram semeados esses cereais, a compor as chamadas “hortas de Osíris”, outro símbolo, além do escaravelho, da ressurreição. Aliás, o cadáver sempre foi um grande mistério. Afinal, o que há nos corpos vivos que os distinguem dos que estão mortos? O que de fato separa Bá e Ká em sua essência?
Essa mesma preocupação expressavam os filósofos pré-socráticos por volta do século 6 a.C. Em suas inquietações, eles buscavam pela base última da vida, a essência fundamental que por ela respondesse. Tales dizia ser a água; Anaximandro, o ilimitado; para Anaxímenes seria o ar, e Demócrito julgava ser o átomo; Empédocles imaginava fossem os quatro elementos em conjunto. Algo havia de existir que explicasse a vida.
Muito antes disso, porém, por volta de 3000 a.C., os egípcios deparavam-se com um fenômeno que, embora estranho, era espontâneo e comum diante deles: a mumificação. Isso porque na era pré-dinástica as sepulturas eram muito simples, meros buracos na areia do deserto onde os corpos eram atirados. Naquela atmosfera árida, a desidratação ocorria antes mesmo que se adiantasse o processo de apodrecimento desses corpos; e, por serem as campas pouco profundas, era comum que tempestades de areia as destampassem, espalhando cadáveres naturalmente mumificados pelo caminho. Isso teria propagado a crença de que os corpos deviam ser preservados, já que a natureza lhes revelava esse desejo. Procedimentos técnicos que mantivessem a textura do corpo pelos séculos afora passaram a ser prestigiados, ao lado dos métodos de enfaixamento, feitos geralmente com duas faixas que se intercalavam e se prendiam, a representar as duas irmãs, Ísis e Néftis, a abraçar Osíris após sua morte.R.Planeta.

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