sexta-feira, 15 de novembro de 2013
Mulheres egípcias: religião, sociedade e nobreza.
Falar sobre história das mulheres não é uma tarefa fácil, principalmente quando vamos abordar essa história na antiguidade, onde encontramos uma grande dificuldade com relação às fontes, ou seja, aos documentos históricos. Essa dificuldade de estudo está relacionada ao fato de que as fontes eram produzidas, em sua maioria, pela classe masculina e quando vamos analisá-las, precisamos filtrar o silêncio por trás de cada palavra e contexto de quem escreveu, pintou, ou produziu essas fontes, sejam elas iconográficas (imagens), escritas ou arqueológicas (vasos, estelas, entre outros objetos, que possam nos trazer algumas informações sobre determinada época). Neste artigo vamos falar um pouco sobre a história das mulheres no Egito Antigo, numa visão mais geral, porém cuidadosa.
Aprendemos que as mulheres egípcias viviam em pé de igualdade com os homens. Na realidade, se comparado a outras sociedades antigas, realmente houve um lugar de destaque para as mulheres no Egito, mas não podemos esquecer que havia uma hierarquia. Devido a isso, é necessário tomarmos certo cuidado com esse tipo de afirmação, pois existem documentos, como os ensinamentos de Ptah-Hotep - um conjunto de máximas do século 18 a.C -, que instruem os maridos a manterem as suas esposas afastadas de funções próximas ao poder: “Reprima-a, pois seu olho é um vento de tempestade quando ela encara”. Aqui é possível analisar que mesmo existindo um reconhecimento das funções das mulheres, elas não tinham total autonomia sobre si, pois sempre dependiam do pai, marido ou outro responsável para guiá-las. Contudo, não podemos esquecer que estamos fazendo uma generalização, ou seja, existiram mulheres que agiram de maneira diferente, e conseguiram se destacar e até obter cargo de poder no governo do Egito (Mulheres da nobreza). Assim, o objetivo deste artigo é abordar a história das mulheres egípcias na religião, sociedade comum e nobreza.
No contexto da religião as mulheres da nobreza possuíam instrução e desempenhavam um papel importante no culto religioso de vários deuses egípcios, podendo exercer diversas atividades como sacerdotisas, cantoras ou dançarinas; sendo assim responsáveis por funções como tocar instrumentos e cantar no culto aos deuses.
Em um dos mitos da criação mais conhecidos, vemos que das águas caóticas, antes da intervenção do deus criador, já existiam quatro casais que influenciavam o movimento e a transformação. Mediante a ação do deus criador surgiu o primeiro casal divino, Shu (ar) e Tefnut (umidade do ar), que por sua vez deu origem a outro casal, Geb (Terra) e Nut (Céu), que originaram os deuses Isís, Osíris, Néftis e Seth. Aqui percebemos que houve uma interação de pares femininos e masculinos para formação do universo. Através de fontes arqueológicas (estelas, pinturas nas tumbas, papiros, etc.) sabemos que no mundo divino, o pensamento religioso era habitado por inúmeras divindades femininas, a quem eram prestados cultos e oferendas. Podemos citar a deusa Ísis, que é associada como uma boa mãe e esposa, entre outras representações que a mesma possui. Assim, percebemos o papel divino da mulher como parte importante na criação do universo e como deusa que protege e salva.
Na sociedade egípcia as mulheres tinham a função de gerar e curar, elas podiam ter posse de terras e possuir bens próprios. Sabe-se ainda que o casamento funcionava como um ato social com consequências econômicas, de legitimidade, em relação à herança e de sucessão. Segundo documentos da III e V Dinastia, as mulheres podiam administrar a herança dos filhos caso fossem menores, alguns documentos mostram que tanto os filhos, quanto às filhas, recebiam de maneira igualitária a herança. Durante o Reino Médio, as mulheres podiam atuar na justiça como testemunhas e defensoras e em pé de igualdade no trabalho de corvéia (Sistema de trabalho compulsório no Egito Antigo) elas se destacavam na preparação de pães para distribuição do Estado.
No contexto real, onde já comentamos sobre algumas mulheres que exerceram o poder no Egito Antigo, podemos destacar Hatshepsut, considerada a mais poderosa rainha, que governou o Egito Antigo no século XV a.C. Com toda força política e carisma, ela usava a dupla coroa do faraó, indicando sua soberania sobre as duas terras, ou seja, o Alto e o Baixo Egito. Até então nenhuma mulher havia se tornado faraó, no máximo esposas dos reis ou regentes de seus filhos. Ainda no campo de mulheres de destaque, não podemos deixar de falar sobre outra mulher de grande importância, que conseguiu assumir uma função de poder: a rainha Cleópatra.
Cleópatra VII fugiu totalmente à regra dos padrões estabelecidos da Grécia clássica helênica de submissão, onde a política é de destaque masculino, e conseguiu, segundo documentos, com muita iniciativa e poder de decisão, chocar os homens da época, homens que tentaram deturpar a imagem de Cléopatra, colocando-a como muito bela e sedutora para desqualificar suas funções intelectuais. No período, uma mulher não podia ter tamanha capacidade de poder e artimanhas, por isso, segundo os padrões da sociedade em que a mesma viveu, só se conseguiria todo esse poder através da sedução. Não podemos deixar de lembrar que Cleópatra foi a ultima governante do Egito Antigo, antes da sua incorporação como província do Império Romano.
Observação: Essas mulheres da nobreza tiveram ascensão de poder com apoio masculino, caso contrário elas não conseguiriam manter seus tronos por tanto tempo. No caso das duas rainhas, elas eram filhas de faraós já falecidos, o que facilitou a situação delas no campo de privilégios.
Assim, neste artigo procuramos passar ao leitor não apenas a visão clássica da mulher no Egito Antigo, que nos transmite uma visão de igualdade com relação ao homem, mas também uma visão critica sobre essa história, que ao mesmo tempo nos fascina pela curiosidade, escassez das fontes e pelo desejo da busca por compreender um pouco mais a história das mulheres na antiguidade. Pensamos muitas vezes em mulheres como Hatshepsut e Cleópatra VII, que nos trazem mais informações registradas sobre como as mulheres(nobreza) viviam na antiguidade, do que as mulheres que trabalhavam nos campos. Através de análises por filtros destas nobres, conseguimos chegar até as outras mulheres, divinas e servas, que também possuem uma história que merece ser contada, mesmo que seja através do silencio das fontes.
Ana Clésia Santiago.
Monitora do Museu Egípcio e Rosacruz.
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