contos sol e lua

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segunda-feira, 14 de setembro de 2009

LILITH.


Lilith não é um planeta, mas o segundo centro da órbita lunar. A Lua descreve ao redor da Terra uma elipse. Uma elipse tem dois centros. A Terra ocupa um desses centros de gravitação; o segundo, onde aparentemente não há nada, chama-se Lilith, o centro oculto de gravitação da Lua.

A Lua significa a imaginação. Lilith, o centro oculto de gravitação da nossa imaginação. A Lua significa a memória. Lilith, a memória esquecida, mas que não está esquecida, a memória rejeitada, negada. A Lua significa o subconsciente. Lilith, o centro oculto de gravitação do nosso subconsciente. A Lua significa os valores femininos. Lilith, os valores femininos perdidos, esquecidos, rejeitados pela sociedade patriarcal, a civilização dos pastores de ovelhas. A Lua significa a noite. Lilith, as trevas. Nas trevas temos medo, estamos perdidos, sem caminhos, sem ponto de referência. Um perigo pode aparecer, vindo de qualquer direção, a qualquer momento.

Esse medo é muito interessante. Entrar conscientemente no subconsciente é fácil: basta devanear, imaginar. Mas e o inconsciente profundo? Onde se esconde? Onde está? Onde está o que ignoramos, onde está a porta?

Quando um psicólogo está a ponto de resolver o problema de um paciente, o paciente tem medo, não volta mais, ou, se voltar, vai enrolar anos e anos (se o psicólogo deixar). O medo é a barreira que impede o acesso ao inconsciente profundo. A barreira é a porta que procurávamos, a porta do inconsciente profundo.

Quando temos medo, esse tipo de medo que passa como um flash, porque não queremos saber, vale a pena aproveitar, não deixá-lo escapar. Esse medo é feito apenas de trevas. A consciência é Luz. Enfrentando conscientemente o medo, as trevas se iluminam, o medo se dissolve: era uma ilusão. Entramos, conscientemente, no inconsciente profundo, recuperando capacidades esquecidas, poderes perdidos e mais carisma. Recuperamos o que foi rejeitado, o Poder que rejeitamos, a felicidade que negamos. Nada deve ser rejeitado. A Alquimia, que tem por propósito destilar, diz que o mais precioso de tudo são as cinzas.

Nos templos do Tibete, outrora era exposta, no altar, a pintura de um demônio. Em cima, a pintura de um Deus. Trata-se da mesma entidade, nas trevas e na Luz. Claro que nas trevas do inconsciente algumas Energias nossas atuam de maneira cega, prejudicial. Mas, se tomarmos consciência delas, vamos usá-las de maneira consciente, luminosa, benéfica. A repressão não resolve nada, apenas rejeita para o inconsciente algumas Energias desordenadas, que cegamente vão causar danos.

Giordano Bruno, um místico italiano, que foi queimado vivo pela Santa Inquisição, dizia: "Em Deus, temos nosso ser. Fora dEle, não podemos cair." Cair para onde? Tudo é divino. Tudo é vivo, em evolução. Paciência. O crescer leva tempo. Em uma hora, você pode confeccionar uma flor artificial. Uma rosa viva é diferente, leva tempo para florescer. Mas é uma rosa. Rejeitar não resolve nada, é rejeitar a Realidade, perder o contato com a Realidade e provocar doenças. Nossa civilização é doentia, hipócrita, psicopata. Autoridades religiosas nos ensinaram que somos pecadores, que somos um erro da Natureza, um erro de Deus: estranha concepção do Divino.

Deus seria um pai incompetente, que mandou seu filho único sofrer, de maneira inútil, para salvar a turma de vagabundos que somos e fracassou. Não é bem assim: Deus não é neurótico, nem somos vagabundos.

Há cinco mil anos atrás, mais ou menos, ocorreu uma revolução, quando a humanidade passou da vida perigosa da caça, devendo enfrentar feras, para a vida mais tranqüila dos pastores de rebanho. Antes, quem dominava era a mãe, a vida, a intuição da mãe, capaz de avisar os caçadores: "Não vão por aí, tem feras. Mas, para lá, vão encontrar caça." Com a vida mais tranqüila dos pastores, essa faculdade pareceu menos importante e o Pai pôde tomar o Poder. Ele tinha medo do Poder feminino: proibiu. Faz cindo mil anos que é proibido ser mulher. Ser mulher é um pecado imperdoável em um mundo patriarcal. A Bíblia começa pela culpa, continua pela culpa, acaba no Apocalipse da culpa e a culpa é de quem? Da mulher!

A imagem máxima em nosso mundo interior é a imagem de um Deus Pai. E a Mãe? Fazemos de Deus uma palavra masculina: é um erro de gramática que, de maneira sutil, condiciona nosso inconsciente. Rezamos o "Pai Nosso", sem perceber que essa oração distorce nossa inteligência, nossa alma, nossa sensibilidade, nosso destino. Deveríamos rezar "Pai Nosso, Mãe Nossa. Mãe Nossa, Pai Nosso". Os Evangelhos contam que Jesus ensinou essa oração. Os Evangelhos não estão bem informados. Existe ainda um monólito da Babilônia, gravado dois mil anos antes de Cristo, que contém, palavra por palavra, essa oração patriarcal. Somos condicionados a perceber apenas a metade masculina do Divino, apenas a metade masculina da Realidade. Mas quem percebe apenas a metade, não é capaz de compreender a metade! Esse mundo que rejeitou a dimensão feminina da Realidade não é um mundo masculino, mas apenas um mundo patriarcal, um mundo de pastores de ovelhas. Até hoje, algumas pessoas se dizem Pastores. Não somos ovelhas. Somos gente.

As mulheres foram massacradas. Mas os homens estão em uma situação pior: "Eu sou homem. Eu tenho o dever de ser superior a elas. Não consigo porque não é verdade. Mas não sei que não é verdade. Tenho medo. Muito medo. Medo de ser um homem fraco. Vou esconder essa fraqueza dos outros e de mim: não vou reconhecer. Vou negar minha sensibilidade, negar o que percebo, negar o que compreendo. Vou me culpar e culpar os outros. E para provar que eu sou viril, de vez em quando vou agir de maneira brutal!" O papel de macho é insustentável. Para sobreviver no seu papel de macho, os homens estão prontos a cometer qualquer besteira. Cometem qualquer besteira.

Lembrei-me, com espanto, do meu casamento na França, há muito tempo atrás. O padre falava muito bem. Posso ainda ouvir sua voz profunda. Dizia: "A esposa será fiel como Sarah, será submetida como Raquel." Terminou. Acabou. Fomos felizes durante quatro anos de namoro. Casados, foi um inferno. Tinha o dever implícito de ser superior a ela. Ela tinha o dever implícito de ser inferior a mim.

Compreender essas coisas é um grande prazer. Inútil, inútil. Tanto as mulheres como os homens, continuamos a sentir e viver o contrário. Compreender pela metade racional da inteligência é não compreender nada. Uma compreensão verdadeira é uma compreensão total, viva. Compreender com todo o ser.

Não temos culpa nenhuma. Durante cinco mil anos fomos sugestionados, programados assim. Precisamos falar ao nosso mundo profundo, em termos que ele possa entender: em imagens, em sentimentos.

Jung, de maneira confusa, fala dos arquétipos que condicionam o inconsciente coletivo. Os egípcios antigos tinham uma concepção clara dos arquétipos. Usavam, conscientemente, os arquétipos. Quando mudava a época, o momento da evolução, tinham a energia, a coragem de destruir templos, para edificar novos templos aos novos Deuses, aos novos arquétipos capazes de orientar uma civilização. A civilização deles perdurou quatro mil anos.

O novo arquétipo capaz de orientar nossa civilização patriarcal em agonia, o novo Deus é a Deusa. Claro que o Divino, no plano espiritual, não tem forma, nem masculina, nem feminina. Mas, no plano astral, no subconsciente, tem uma forma. Consoante a forma que subconscientemente damos ao Divino, a forma que, subconscientemente, damos à Realidade, nossa vida é neurótica ou sadia. Nossa vida era neurótica.

Estamos diante do desconhecido. Os valores femininos foram rejeitados. Nenhuma teoria pode nos ajudar. Uma teoria é apenas um fragmento de Realidade e, pior ainda, lida apenas com o conhecido. Mas, se usarmos a imagem simbólica da Deusa, se imaginarmos e amarmos a imagem máxima do feminino, vamos fazer isso de maneira racional, sabendo o que estamos fazendo. Nossa imaginação vai compreender. Nossa sensibilidade vai compreender.

Vamos sentir, perceber a imensa dimensão feminina do Universo. Então, vamos também perceber a verdadeira dimensão masculina da Realidade. Vamos perceber a Realidade e a Realidade é linda: é divina.

Para descer ao mais profundo, precisa subir ao mais alto. Para dominar o subconsciente mais escuro, precisa ter acesso ao supraconsciente. A viagem para encontrar Lilith começa com uma viagem a Urano, uma viagem ao supraconsciente.

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